Por Bruno Santana, Diretor de Produtos Procenge
“Achamos que você vai gostar deste filme.” “Não se esqueça de terminar sua série.”. “Veja o que está fazendo sucesso na sua região”. Se você é usuário do Netflix certamente já se deparou com uma destas mensagens. E embora algumas das recomendações sejam de qualidade duvidosa, elas visam garantir que você continue obtendo da plataforma aquilo que você queria quando assinou o serviço: no meu caso, ter boas opções para algumas horas de entretenimento em casa.
A Netflix utiliza muitas práticas e tecnologia para que eu tenha sucesso no meu objetivo de me divertir com meus filhos usando sua plataforma. Esse estímulo e sugestões de títulos me oferecem valor, para que eu tenha boas experiências e não queira cancelar o serviço ou trocá-lo por um concorrente. No modelo de negócios da Netflix o ticket mensal por cliente é baixo. E os investimentos necessários para manter a plataforma atualizada com novos títulos e produções e atrair novos clientes, não. Por isso, é preciso estender ao máximo a jornada do cliente com a empresa, potencializando seu Life Time Value, que é a previsão de receita futura que o cliente proporcionará em todo seu ciclo com a empresa. Além disso, é um negócio que exige escala. Não adianta conquistar milhares de clientes por mês se outros milhares cancelarem o serviço em paralelo. Perder cliente é sempre um obstáculo para o crescimento.
Assim, não basta mais o cliente sempre ter razão. É preciso que ele nunca tenha razão em querer dispensar os seus produtos ou serviços. A filosofia, técnicas e práticas para fazer com que toda a empresa e sua estratégia estejam centradas no cliente, colocando-o em primeiro lugar, tem sido chamada nos últimos anos de Sucesso do Cliente (ou CS, Customer Success).
No livro “Customer Success: como as empresas inovadoras descobriram que a melhor forma de aumentar a receita é garantir o sucesso dos clientes” de Dan Steinman, Lincoln Murphy e Nick Mehta, os autores vão mais além. Garantir o sucesso do cliente, mais do que manter a receita recorrente, pode ser um impulsionador de novas receitas. O cliente satisfeito, além de te indicar e servir como referência para novos clientes, tende a adquirir novos serviços. Se você já trocou seu plano básico da Netflix para o Premium sabe do que estou falando.
E por onde começar? No mesmo livro, são apresentadas dez leis que você precisa conhecer para começar a aplicar o Customer Success na sua organização:
Primeira Lei: Venda ao cliente certo
Sim, é isso mesmo, nem toda venda vale a pena. É preciso vender para o cliente certo. Deve haver compatibilidade entre seus produtos e o cliente que você deseja atingir. É preciso definir um mercado alvo e atuar nele. Os custos para obter e manter um cliente que não é compatível com o seu produto são elevados, incluindo os desgastes de relacionamento e problemas de imagem. Em um extremo, imagine o que a Netflix teria que fazer para vender e manter um cliente que não gosta de filmes e séries, mas apenas de ver esportes na TV. Não é o cliente dela, não vale a pena tentar conquistá-lo.
Segunda Lei: A tendência natural dos clientes e fornecedores é se afastarem uns dos outros
Depois do negócio fechado, vários fatores podem levar o cliente a se afastar naturalmente do fornecedor, até que haja um rompimento definitivo. O cliente não conseguiu o ROI esperado, paralização ou demora na implantação, perda do sponsor ou usuários-chave, produto com má-qualidade ou incompleto e até fatores pessoais. Do outro lado, a sua tendência pode ser buscar novos clientes e se afastar daqueles já inseridos na base. É importante que sua empresa esteja sempre presente, agindo ativamente no relacionamento com o cliente, para tratar sempre as possibilidades deste afastamento.
Terceira Lei: Os clientes esperam que você os torne extremamente bem-sucedidos
Desde o início, entenda quais os problemas que o cliente pretende resolver com seus produtos. Defina indicadores que meçam se ele está obtendo o sucesso pretendido. Acompanhe se os resultados estão sendo atingidos e quão fácil ou árdua está a experiência do cliente para obter estes resultados. Faça com que o cliente tenha esta visibilidade, pois tão importante quanto fazer o cliente ser bem sucedido é mostrar que fez. Este processo também ajudará a identificar os problemas e fazer os ajustes necessários.
Quarta Lei: Monitore e gerencie implacavelmente a saúde do cliente
Antes de cancelar um contrato, todo cliente apresentará sinais de que a relação não está boa e de que há um risco eminente. É como nosso corpo, que apresenta diversos sintomas antes de chegar a um estado grave ou irreversível de uma doença. Monitore esses sinais: O produto está sendo subutilizado? O cliente tem acessado o suporte frequentemente? Como ele está respondendo pesquisas de satisfação? O cliente está engajado e participa das ações de marketing? Há um relacionamento executivo com o cliente? Estão sendo realizadas novas vendas? O cliente está pagando? O conjunto de respostas a essas e outras perguntas irão te dar um panorama claro da saúde do cliente.
Quinta Lei: Não é mais possível construir a lealdade com relacionamentos pessoais
“Aqui você conversa com o dono!”. Esta frase é muito bacana e com certeza os estabelecimentos que mantem esta linha tem um ótimo relacionamento com os clientes. Mas elas terão dificuldade para crescer. Para se ter escala, não há como manter o cliente fiel baseado no relacionamento pessoal com todos. Segmente seus clientes. Defina critérios que te ajudem a identificar que grupo de clientes deverá ter uma relação mais pessoal e personalizada (high touch), que grupo pode ter uma interação mais padronizada (low-touch) e aqueles com os quais toda iteração deve ser movida por tecnologia (tech-touch), mas de forma pessoal e relevante. Webinars, Podcasts, Comunidades, Grupos de Usuários, Conferências, E-mails são boas ferramentas para estar próximo do cliente.
Sexta Lei: O produto é o seu único diferencial escalável
Todas as ações visando o sucesso do cliente devem ser suportadas por um bom produto. Este precisa ser escalável, o que significa que não é necessário aumentar custos e estrutura para que mais clientes usem. O produto deve oferecer uma ótima experiência para quem usa, por isso CS e área de produtos devem estar em comunicação frequente, e deve ser estabelecido um canal de comunicação para que os clientes possam dar feedback, que sirvam de fonte para aprimoramentos e melhorias.
Sétima Lei: Melhore obsessivamente o Time-to-Value
Este é um dos princípios da Agilidade aplicado ao CS. O cliente precisa perceber o quanto antes o valor da aquisição. Estabeleça as métricas de sucesso concretas e implante seu produto iterativamente para extrair valor desde cedo, buscando já atingir as medidas de sucesso mais simples. É importante também saber adaptar-se em tempo real, agindo assim que perceber que o valor esperado está em risco.
Oitava Lei: Compreenda em profundidade as métricas internas relacionadas aos clientes
Customer Success e Analytics andam juntos. Meça todas as informações relacionadas a clientes, principalmente aqueles que ajudarão a entender como maximizar as receitas e reduzir as perdas. Defina um plano de medição, incluindo indicadores que devem ser avaliados, metas e linhas de controle, frequência de medição e modelos de análise. A saúde do cliente, prevista na quarta lei, precisa estar representada nesses números.
Nona Lei: Impulsione o sucesso do cliente com processos e métricas rigorosas
Customer Success precisa dar resultado. É importante definir métricas que comprovem o retorno do investimento em CS. Aumento de receita na base de clientes e redução do churn são algumas das metas que devem ser seguidas pela área de CS. Os processos de CS definidos para a organização precisam ser rigorosamente seguidos para que haja este resultado. Por isso, ajuda bastante se o CS for uma área organizacional separada do restante da estrutura, respondendo preferencialmente ao CEO da organização, empoderada por ele e com autonomia para fazer com que as demais áreas da organização sigam o que for definido.
Décima Lei: É um compromisso de cima para baixo. De toda a empresa
Customer Success não é simplesmente uma nova área organizacional. Também não são apenas novas atividades que devem ser realizadas pelos processos de pós-venda para tentar manter o cliente satisfeito. Customer Success é uma filosofia de trabalho que deve estar incorporada estrategicamente em toda a organização, partindo dos mais altos níveis da Direção. É fazer com que cada ação realizada reflita como a empresa enxerga e se compromete com os clientes.
Voltando para a Netflix. Enquanto ela continuar a oferecer experiências como “The Crown”, “Cobra Kai”, “Ozark” e “La Casa de Papel”, mantendo um preço justo, com uma plataforma que não trava ou tem legendas mal feitas, ela continuará contando com a minha assinatura. Mesmo que às vezes passe horas para escolher o que será assistido. Vocês também?